terça-feira, 16 de fevereiro de 2010




A editora Caminho das Palavras associou-se à Porta Mágica, oferecendo parte das receitas das vendas do livro “Hoje, o Chefe Sou Eu”. Na compra de cada livro está a ajudar a Associação na construção de um projecto de vida para as crianças.

Ao editor André de Carvalho Pereira fica o agradecimento e o reconhecimento pelo seu contributo. Brevemente vamos realizar, em Montemor-o-Novo, um Showcooking para todos aqueles que na cidade e fora dela compraram o livro, podendo desfrutar de uma tarde solidária e de convívio à volta da cozinha, com os mais novos.

Homenagem

Ao inaugurar a minha colaboração neste espaço de reflexão, faço-o homenageando um Amigo/poeta, e todos os que fazem no seu dia a dia, pessoal e profissionalmente, da aceitação da diferença uma causa.

O AVIÃO DE PAPEL
por:
José Filipe Rodrigues

O Zac é uma criança com onze anos de idade, com alguns atrasos no desenvolvimento. Ele foi diagnosticado com autismo, complicações relacionadas com Défices de Atenção e de Integração Sensorial. As suas história familiar e diferentes capacidades para desenvolver deixa-riam muitas pessoas desmotivadas, pessimistas, sem verem a luz ao fundo do túnel. Diferentes estratégias sensoriais, envolvendo os sete sentidos do corpo, feedback positivo, actividades de importância pes-soal, e uma equipa motivada, de terapeutas e professores do ensino normal e especial, transformaram o Zac numa criança feliz e autocon-fiante. Ele graduou no final do ano lectico, em diferentes áreas e aspectos, na sua escola do Ensino Básico.
O Zac pensa que “não é justo graduar no final do ano” e abandonar a escola do Ensino Básico. Na sua Escola, ele tem vários amigos, a sua professora favorita e os vários terapeutas que lhe proporcionam actividades de aprendizagem com alegria. A nova escola é um desafio que desencadeia medo e outros tipos de stress. Agora, eu sei, ele tem variadas capacidades e potencialidades para esculpir muitos projectos criativos e realísticos no seu futuro. O Zac só necessita de ser capaz de manter a mesma evolução e o mesmo ambiente construtivo nas aprendizagens para ser capaz de sair vencedor nas futuras batalhas que irá enfrentar.
Numa das minhas últimas intervenções, o Zac e eu utilizámos acti-vidades para aprender a usar vários passos, no desenvolvimento de uma cadeia contínua, para finalizar um objectivo. Ele, de há muito tempo, desejava aprender a fazer aviões de papel. As nossas apren-dizagens demoram cerca de três semanas. Quando finalizámos os nosso projectos, o Zac e eu fomos para o páteo da escola testar os nossos “supersónicos.” O meu avião, em vez de subir, desceu como um parafuso na água. O avião do Zac voou bem alto, quase até ao telhado da escola, depois desceu lentamente, passou em frente das janelas das salas de ensino especial, terapia ocupacional fisioterapia, arte e aterrou junto à porta do laboratório de ciências.
No dia em que o Zac completou o seu projecto, pela informação prestada pela sua mãe, levou o avião para casa, foi para ao parque voar com o seu “supersónico” e adormeceu com ele, na mesma almo-fada.
Em Maio, a equipa de terapeutas e professores do ensino normal e especial reuniu-se para definir novos ojectivos para o Zac. Ele, tenho quase a certeza, não mais necessitará dos meus serviços. Durante a reunião, a mãe agradeceu, muito em especial, a intervenção de um homem que proporcionou muita felicidade ao seu filho: “ele ensinou o meu filho a dobrar papel para construir aviões.” Eu apenas fui capaz de reportar os resultados das minhas terapias. O Zac é um dos muitos heróis que eu tenho nas escolas, capazes de me ensinarem muito, pro-fissionalmente e pessoalmente. Este sistema escolar, sem ser perfeito, dá possibiliades aos poetas para construirem “casas com cimento e tijolos verdadeiros, onde as pessoas vivem, na certeza de que as for-ças da gravidade dificilmente as farão ruir.”
O Zac não sabe ainda que, nas diferentes salas de aulas da sua escola, durante o ano lectivo que findou, ele voou muito mais alto do que o seu avião de papel.

Vai abrir-se uma Porta Mágica



Já devia ter falado mais vezes neste assunto. O que me tem impedido? O tema e a instituição em causa estão ligados a um familiar muito próximo e tal facto talvez me tenha feito adiar uma ou outra manifestação mais entusiástica. Decidi de mim para comigo que não havia motivo forte para novos adiamentos. Pelo contrário: havia, sim, motivos para escrever sobre o assunto – sobre a sua importância na sociedade civil montemorense, sobre a sua urgência e o entusiasmo com que um grupo de cidadãos tem vindo a dedicar-se à causa.
Fundada há 3 anos, a Porta Mágica, Instituição de Solidariedade Social, está muito perto de conseguir o seu grande objectivo: abrir um espaço onde crianças e jovens em situação de risco possam ser acolhidos temporariamente, até ao momento em que se proceda ao seu reencaminhamento pelos serviços competentes, para a sua família, depois de esta ter adquirido novas competências, ou para famílias onde possam ser amados, respeitados e felizes. Para que essa Casa, localizada em Montemor, possa tão depressa quanto possível servir os objectivos da Associação, tem sido necessária a promoção de angariação de fundos, através de diversas iniciativas que só têm comprovado o interesse e a solidariedade que muitos cidadãos, amigos uns, anónimos outros, têm manifestado a favor do projecto.
O pintor Malangatana, recentemente doutorado Honoris Causa pela Universidade de Évora, e profundamente ligado à Associação, aceitou o convite da Porta Mágica para, como seu Patrono, atrair as atenções de outras instituições e fontes de apoio.
Integrada neste ciclo de iniciativas com o objectivo de, após todos os procedimentos legais concluídos, abrir, finalmente, a sua Porta Mágica, vai realizar-se no próximo dia 8 de Maio, no Cine-teatro Curvo Semedo, uma grande gala de variedades que contará sobretudo com a presença de artistas de Montemor, que têm mostrado, ao longos dos anos, o seu amor à arte e a sua paixão pelas grandes causas. A porta daquela grande sala de espectáculos também vai ser mágica nessa noite, porque é por ela que o meu caro leitor vai entrar para, com o seu contributo, fazer mais felizes muitas crianças e jovens que precisam de si.
Completamente por dentro de toda esta movimentação, e contagiados pelo entusiasmo da mãe, os meus filhos gémeos de 15 anos perguntaram-me se, depois de aberta a Casa, havia possibilidade de fazerem voluntariado. Não lhes respondi… Senti uma certa humidade a turvar-me o olhar.

João Luís Nabo